Paraíba

TRUCULÊNCIA

Famílias da Ocupação Margarida Maria Alves são despejadas de forma truculenta na Praia do Sol, em João Pessoa

PM chegou a jogar bombas de gás contra famílias e tratores derrubaram os muros da ocupação; 83 famílias vivem no espaço

Brasil de Fato PB| João Pessoa |
Momento em que o trator destrói os muros da Ocupação e segue para derrubada dos barracos - Reprodução - Redes Sociais

Na manhã desta quinta-feira (23) as famílias da Ocupação Margarida Maria Alves, que fica localizado no bairro de Valentina, na Praia do Sol, zona Sul de João Pessoa, foram surpreendias ao serem acordadas dentro de um cerco realizado por equipes da polícia militar da Paraíba e Guarda Civil Municipal de João Pessoa (GCM). Todas as estradas que davam acesso à ocupação foram fechadas impedindo a passagem de moradores, advogados, movimentos sociais e até da imprensa. Enquanto isso, tratores destruíam os muros da ocupação e os PMs chegaram até a jogar bombas de gás sob os moradores, local onde havia também crianças e idosos.

O despacho para desocupação da área foi assinado na última segunda (20) pelo juiz Romero Carneiro Feitosa e expedido com urgência o processo de desocupação. Porém, nesta quinta (23), sem aviso prévio aos moradores do local, os agentes fecharam as vias de acesso e começaram o processo de forma truculenta usando tratores para derrubada dos barracos e bombas para afugentar os ocupantes. 

“Aqui só tem família, policial. Estamos com medo”, gritou uma moradora para a polícia. Veja nos vídeos enviados ao BDF-PB por moradores da Ocupação:
 


Também participaram dessa operação de despejo, o Corpo de Bombeiros, Ministério Público, Cagepa e Energisa. De acordo com a PM, “ as equipes estão só cumprindo uma reintegração de posse na região”. De acordo com informações, mais de mil agentes públicos participam dessa “operação”, Polícias Civil e Militar, Corpo de Bombeiros, Guarda Municipal de João Pessoa, Ministério Público da Paraíba, Poder Judiciário, Secretaria de Assistência Social, Direitos Humanos, Secretaria de Mobilidade Urbana (SEMOB), Cagepa e Energisa.

O Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras por Direitos da Paraíba (MTD-PB) já está no local prestando apoio às famílias junto da Defensoria Pública e afirmam que existem vários problemas nessa ação. 

“Primeiro, do ponto de vista jurídico, tem vários problemas; um que, em caso de despejo de vulneráveis, a defensoria deve ser comunicada e isso não aconteceu. Todos foram pegos de surpresa. Além de quem, numa ação de ofício pública, jamais deveria impedir a presença da imprensa no local, até por questão de lisura do processo, da própria segurança dos agentes públicos de que a ação está ocorrendo de modo legal, para que nenhum direito seja violado; além de assegurar que nenhuma família sofra violência física ou dos seus bens”, afirma Gleysson Melo, coordenador do MTD-PB

Gleysson ainda afirma que a Defensoria Pública não está conseguindo ter acesso às famílias, os advogados estão sendo barrados e os moradores não conseguem ter acesso a seu direito básico de defesa e apoio jurídico.

“Vamos nos reportar ao CNJ, pela possibilidade de nulidade do processo, além de um procedimento administrativo contra quem tá a frente dessa operação, seja na corregedoria, seja no órgãos similares, para que respondam administrativamente por terem impedido que as famílias tenham o legítimo direito a defesa, acesso aos seus advogados, advogados estes públicos”, completa. 

ENTENDA O CASO  

A Ocupação Margarida Maria Alves já existe há mais de 5 anos e atualmente estão acampados ali uma média de mais de 80 famílias. A área ocupada fica na antiga “Fazenda Paratibe”, próximo à Praia do Sol, pertencente à COMPANHIA INDUSTRIAL DO CISAL. O local onde ocorreu a ocupação, segundo o Ministério Público, é uma Área de Preservação Ambiental (APA). A professora do Departamento de Geociência da UFPB, Andréa Sales, afirma que só agora essa área teve “o olhar” do interesse público como área de preservação. 

“O caso de despejo forçado só reforça a necessidade de um zoneamento mais rigoroso e realizado com a participação da população. A área em questão, até 2019, não tinha dono, é uma área de proteção ambiental, não sabemos de lá pra cá o que aconteceu quanto a propriedade, estamos investigando. Houve o desmatamento sim, porém o desmatamento acontece pela negligência do poder público que também acelera o processo de devastação de outras áreas de proteção que temos na cidade. É o caso, por exemplo, do supermercado Matheus na av. Cirilo; da empresa Moura na av. Rui Carneiro; ambas tiveram o zoneamento alterado por decreto do prefeito Cícero Lucena de forma unilateral e sem cuidado e atenção com os riscos. Mas quando é o caso de ocupação para moradia, a truculência do estado está a serviço dos interesses de poucos”, afirma a professora.

Em documento oficial, o juiz Romero Feitosa afirma que os pedidos dos moradores para suspensão da reintegração está indeferido, ou seja, o despacho pedia reintegração imediata.

"Igual sorte também não merece prosperar as alegações dos réus de que esta ação de reintegração de posse seria uma ação de força velha, uma vez que haveria nos autos documentação comprovando que a invasão teria ocorrido em janeiro de 2021. Com efeito, não se pode confundir o momento do esbulho, quando o proprietário ou possuidor perde em definitivo a sua posse para os esbulhadores, com invasões/incursões furtivas e repelidas. E, no caso, na própria decisão que deferiu a liminar de reintegração de posse restou claro que a perda definitiva da posse por parte dos autores se deu há menos de ano e dia do ajuizamento da ação. Registre-se ainda, que já foi entregue pelo Comando-geral da Polícia Militar da Paraíba e a Guarda Municipal de João Pessoa o plano de estratégia de execução da ordem de reintegração de posse", pontua o despacho. 

O Brasil de Fato PB tentou entrar em contato com a Comissão de Solução de Conflitos Fundiários do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Paraiba e também Sedurb da Capital para entender o que estava acontecendo e obter respostas sobre a falha de impedimento de advogados e imprensa estarem no local, mas até agora não obtivemos retorno. Reiteramos que o espaço está aberto para esclarecimentos. 


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Edição: Cida Alves