Paraíba

ELEIÇÕES PB

“A questão da fome deveria ser uma das pautas centrais do 2º turno na Paraíba”, afirma MST

Para coordenador sem-terra, é preciso sair do “campo raso da política” e discutir “o que é central para a vida do povo”

Brasil de Fato | João Pessoa - PB |
Em 2022, mais de 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil, segundo Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar - Carla Batista/MST

Desde 2018, as eleições brasileiras (gerais e municipais) têm sido marcadas pelo forte embate ideológico protagonizado, sobretudo, por setores políticos de extrema-direta. Alimentados por redes de desinformação e sistemas de produção massiva de notícias falsas (fake news), os debates e campanhas políticas tem substituído os tradicionais temas da saúde, emprego, moradia, educação e segurança por outros mais subjetivos e que envolvem termos como “ideologia de gênero”, “anticomunismo” e a defesa “da família, dos valores e do cidadão de bem”.

De acordo com Gilmar Felipe, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra da Paraíba (MST-PB), além de esvaziar a discussão política, essa mudança de estratégia das campanhas tem como objetivo fazer com que a população esqueça do que, segundo ele, “é central para a vida povo”.

Ao avaliar as campanhas no primeiro turno e considerar os desafios que se impõem no segundo turno das Eleições 2022, Gilmar comenta que é fundamental que os setores progressistas aproveitem a campanha eleitoral para “retomar para a centralidade do debate aquilo que é estruturante para a sociedade” e não caiam no “campo raso da política que Bolsonaro tenta empurrar pra gente”. Neste sentido, para ele, a questão da volta da fome deveria ser o principal assunto do segundo na Paraíba.

“O que está em pauta [no segundo turno] é uma disputa de projeto de sociedade, de concepção do mundo, de concepção de relação humana. E é isso que tem que pautar a nossa vida. A gente está em um momento onde a fome se espalhou na nossa sociedade. A fome tomou conta da vida do nosso povo. A miséria, o povo morando na rua. É importante todo mundo ficar atento a isso”, pontuou.

Agricultor familiar e assentado do MST há mais de 20 anos, Gilmar explica que mais do que a apresentação de políticas assistencialistas, o tema da fome, por si só, envolve uma gama de discussões que envolve desde a desigualdade social até a produção agroecológica de alimentos.

“Você não pode dialogar com a fome sem dialogar com a concentração da terra, sem dialogar com o latifúndio e sem trazer como alternativa a reforma agrária, a agricultura familiar e a produção de alimentos sem veneno para o povo. Nós não podemos nunca esquecer a desigualdade que é provocada pela propriedade privada dos meios de produção e pela propriedade privada da terra. Eu acho que esses são temas que devem ocupar a nossa vida política”, concluiu.

Organização Popular

Ainda em relação às Eleições 2022 na Paraíba, o coordenador do MST concorda que, de fato, neste momento, a conquista de votos para os candidatos que defendem os direitos da classe trabalhadora deve ser o principal objetivo de movimentos, partidos, organizações e militantes. Principalmente no atual contexto de escalada da extrema-direita e de ataques à democracia em âmbito federal e estadual.

Porém, além disso, Gilmar observa que a campanha eleitoral pode ser aproveitada como um processo de organização popular capaz de fomentar debates e articulações políticas que, inclusive, se estendem para além do processo eleitoral. Neste sentido, ele destaca a experiência dos comitês populares de luta, criados logo no início das campanhas no primeiro turno.

“Na nossa avaliação, os comitês populares foram o principal instrumento de organização popular atuando dentro do processo eleitoral, dando um outro conteúdo, um conteúdo mais ampliado. Nos assentamentos do MST, por exemplo, tiveram vários comitês populares que ajudaram a fortalecer o debate político entre o próprio povo. E assim foi em todo território da Paraíba”, explicou.


Comitê Popular de Luta do Assentamento Geraldo Pereira, em Olho D´água, Vale do Piancó / Carla Batista/MST

Segundo Gilmar, mais de 80 comitês foram criados em todas as regiões do estado ao longo do primeiro turno. Em relação ao debate político promovido nesses espaços, ele acrescentou:

“Esses comitês tem se tornado centrais para a continuidade do debate com a população sobre os desafios que a gente vai enfrentar na sociedade de agora em diante no enfrentamento ao fascismo. A gente não pode confundir a disputa eleitoral com a luta maior que é a luta de classes, que é esse enfrentamento que se dá entre os dominados e os dominantes. Muitas vezes o processo eleitoral não representa as nossas pautas de verdade, aquilo que a gente almeja como movimentos sociais, como movimentos que representam a classe trabalhadora”, afirmou. 

Além dos comitês populares, em algumas cidades foram organizados comitês municipais com organizações em torno da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

“Mesmo que, às vezes, todo mundo estivesse com suas candidaturas ‘domésticas’, a nível nacional a gente está alinhado a um mesmo processo, a um projeto. Entre esses comitês municipais de luta pró-Lula eu destacaria o de Campina Grande, que foi fundamental para que Lula saísse na frente na cidade”, ressaltou.

Segundo turno

Sobre a campanha no segundo turno na Paraíba, Gilmar aposta no fortalecimento dos instrumentos de organização popular e na unidade das organizações dos setores progressistas no estado em torno da candidatura de Lula e da luta contra o fascismo.

“As organizações tiveram suas candidaturas, seus processos, e agora, no segundo turno, acreditamos que vamos construir uma unidade maior em torno do processo eleitoral. Eu acredito que gente avança muito mais com outros instrumentos e estruturas de organização popular como, por exemplo, as brigadas. A gente vai colocar o MST junto com o Levante, CPT [Comissão Pastoral da Terra] e MAB [Movimento de Atingidos por Barragens] tanto aqui em João Pessoa como em Campina Grande para fazer trabalho de base na periferia para combatermos o fascismo”, destacou o coordenador do MST.

Edição: Maria Franco