Paraíba

Coluna

MEMÓRIAS ANCESTRAIS: POÉTICAS ENCOBERTAS

Card da Campanha no mês da Consciência Negra na COCAM. - Fonte: Ilustração de Lígia Emanuelle “Azulão” (Novembro, 2023)
O diálogo entre memórias [...] negras e indígenas [...] expressa resistência ao apagamento

Por Luz Santos*

Chegamos ao final do Novembro Negro na permanência da efemeridade do dia 20 na construção de novos imaginários. Ao dar continuidade ao debate do Grupo Palmares de Porto Alegre/RS, fundado pelo poeta da Consciência Negra, Oliveira Silveira – Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul¹  - diferentes coletivos ressaltam a importância da preservação da memória coletiva, desde Zumbi e Dandara dos Palmares. Em que pese a importância simbólica deste marco político, a Comunidade Colaborativa de Mulheres Afro-brasileiras e Ameríndias (COCAM) busca sentir-pensar a importância de memórias ancestrais nos diálogos extensionistas entre Obìnrins e cunhãs²

Desde as vivências extensionistas, a COCAM traz nos saberes de quilombos e aldeias a relação indissociável entre mente e corpo, razão e emoção, humano e natureza, experiência extensionista e escrita teórica, vida e morte e revela envolvimentos encobertos pelo desenvolvimento direcionado ao academicismo. Dimensões de afrografias em relação ao tempo e espaço, a COCAM ressignifica o conceito de corpo, ou melhor, corpas³ negras escreviventes, espaço de ser negro/a. Portanto, o diálogo entre memórias ancestrais – negras e indígenas – no ambiente extensionista expressa resistência ao apagamento de cosmovisões ancestrais. Eis a práxis do sentir-pensar.

No contexto acadêmico, percebe-se marcante a necessidade de enfatizar o 20 de Novembro como modo de poetizar a história na perspectiva da cosmovisão. Neste 2023, a considerar que qualquer diálogo se faz com interlocutores, a COCAM lançou em sua conta do Instagram a Campanha pela Consciência Negra: quem são os/as estudantes negros/as do CCAE/UFPB?

Para além de anunciar corpas negras e suas poéticas encobertas pelo conhecimento academicista, a campanha denuncia a invisibilidade de corpas de memórias ancestrais. No sentido matripotente, (re)conhecer corpas negras da UFPB/CCAE implica em desencobrir o início da vida nas que vieram antes de nós – nossas ‘Mais Velhas’, guardiãs dos saberes dos quilombos. Afastando-nos do sexismo, nossas Iyás, por meio de suas memórias, ensinam a perceber, bordar, passarinhar e co-construir caminhos alternativos ao desenvolvimento direcionado ao academicismo da modernidade.

Dentre os saberes, o cuidado com a natureza é co-construído em novo relacionamento com a Mãe Terra, a fim de protegê-la do agronegócio (desde a tese do Marco Temporal). Portanto, tomamos as corpas como território de memória ancestral. Desse modo, perspectivado pelo Bem Viver, a COCAM se organiza desde o amor profundo pela vida no sentir-pensar ausente na maioria das políticas de educação.

Assim, continuemos desencobrindo poéticas e co-construindo novos imaginários. Salve Oliveira Silveira e a permanência da efemeridade do dia 20 de Novembro, aprovado pela Câmara dos Deputados como feriado nacional do Dia da Consciência Negral. Nesse fechar-abrir, lançamos a hashtag:#Sancionao20deNovembroPresidente!

Notas

1  UFRGS concede a Oliveira Silveira título de Doutor Honoris Causa.

2 Os termos Obìnrins e cunhãs são utilizados no sentido de feminino em Yorùbá e Tupi, respectivamente.

3 O conceito é defendido por Luz Santos em sua tese de doutorado.

Para saber mais:

ALVES, Míriam Cristiane (Orgs.). Matripotência e Mulheres Olùso: memória ancestral e a enunciação de novos imaginários. Porto Alegre, RS: Editora Rede Unida, 2021.

COCAM. Conta no Instagram da Comunidade Colaborativa de Mulheres Afro-brasileiras e Ameríndias – COCAM: @recosec.ufpb.

*Maria Luzitana Conceição dos Santos (Luz Santos) integra a Comunidade Colaborativa de Mulheres Afro-brasileiras e Ameríndias (COCAM) e o Movimento de Mulheres Negras na Paraíba. Integrante do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (NEABI/UFPB) e pesquisadora no Núcleo de Estudos e Pesquisas É’LÉÉKO (UFPel/UFRGS). É professora na UFPB e Doutora em Educação pela UFRGS.

Edição: Carolina Ferreira