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Campina Grande, as eleições de 2024 e o papel das esquerdas 

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Há 46 anos, a adm municipal se divide em três sobrenomes: Ribeiro, Cunha Lima e Vital do Rego
“Amar e mudar as coisas me interessa mais
Amar e mudar as coisas
Amar e mudar as coisas me interessa mais”
 (trecho da música Alucinação de Belchior)

Para começo de conversa trago esse trecho de uma das canções do grande Belchior, para lembrar a alma da esquerda, a alma do fazer política, que é mudar as coisas, nunca o conformismo ou acomodação, e sempre a vontade de mudar as situações de injustiça e desigualdades para uma nova situação de igualdade sociopolítica e econômica, para uma nova sociedade, onde a justiça e a paz sejam a garantia da vida plena para todas e todos. Eis a vocação e missão das esquerdas e de todos/as que acreditam na justiça social e ambiental.

Quero no presente texto refletir alguns desafios do hoje e do futuro de Campina Grande, que passa por uma sociedade civil organizada e articulada, passa por mobilizações e trabalho de base, por partidos que representem um novo projeto político para a Rainha da Borborema,  que conquiste e mobilize a maioria dos/as campinenses. 

Olhando para o futuro, penso que devemos combinar essas atuações com estudos e diálogos sobre a realidade do nosso território, partidos políticos com capacidade interna de unidade e proposição, para juntos e juntas, construímos um Novo Projeto Político que também passa pela disputa das eleições, ampliação do nosso campo na Câmara de Vereadores/as e um dia, quem sabe em breve, a conquista da Prefeitura Municipal. E este projeto passa necessariamente por termos uma candidatura própria a prefeito/a nas eleições de 2024 dos partidos que compõem o Fórum Pró-Campina. 

Campina, suas contradições e suas potências

Campina Grande é um município com enormes contradições, um município com um passado de uma potência econômica na região nordeste e que aos poucos foi perdendo este protagonismo econômico e vendo as desigualdades crescerem em seu território. Ao mesmo tempo crescemos em potencial educacional, tecnológica e de inovação, áreas de excelência, de exportação de conhecimento e de mão de obra qualificada. 

Porém, o mercado local em grande parte não absorve o que produzimos em nossas universidades, e pouco temos de soluções socioambientais, de moradia, e de resoluções dos problemas do município como parte da entrega da pesquisa acadêmica e do pouco diálogo entre os setores públicos do município com a nossa academia. Um município que não está preparado para grandes períodos de estiagem ou para 15 minutos de uma chuva intensa, uma infraestrutura precária e que não corresponde aos tempos de mudanças climáticas, a falta de moradia digna e perto dos serviços e do trabalho, um transporte público ineficiente e que piorou depois da pandemia, uma lógica de levar trabalhadores para o seu serviço, como se as pessoas não pudessem se locomover pelo município nos fins de semana, ou nas noites para aproveitar os poucos espaços culturais, de lazer ou de encontros familiares.

Campina Grande é uma potência cultural, de uma rica produção de talentos, seja no campo audiovisual, da música, do teatro, das artes, das batalhas e outras expressões da nossa periferia, é a cidade do Maior São João do Mundo, mas ao mesmo tempo a cidade do pouco investimento em cultura, faltam equipamentos culturais e os poucos existentes seguem precários, até o Governo do Estado não investe nesta área em Campina como deveria, a exemplo da reforma a conta gotas do Cine-Teatro São José. A própria festa do São João, que deveria ser um espaço por excelência de apresentação e divulgação dos artistas da terra, o faz com poucos recursos e sem a devida promoção. Basta ver o prédio atual da Secretaria de Cultura para constatar o quanto esta área não é prioritária no orçamento e nas políticas públicas do município.

Campina é uma potência ambiental, uma cidade na porta do semiárido, uma cidade de transição de biomas, mas a degradação do seu espaço, a falta de políticas com orçamento capaz de tornar Campina Grande um município verde, sustentável e de uma agricultura familiar de base agroecológica não tem sido prioridade e com isso os efeitos das mudanças climáticas avançam sobre o município. Enfim, Campina Grande é uma potência em todas as áreas e pode novamente recuperar o seu protagonismo para um novo ciclo econômico de base sustentável e de justiça social, se começar a enfrentar com força política, mobilização e orçamento, as suas contradições. 

O governo Bruno Cunha Lima

    O governo Bruno Cunha Lima e de seus aliados, no atual momento segue com uma péssima avaliação de grande parte dos/as campinenses, tendo a área da saúde como a grande reclamação contra o seu governo, problemas estruturantes não resolvidos e só adiados, uma rede de saúde básica precária, com estruturas físicas muitas vezes de péssima qualidade, e para piorar um programa chamado de saude de verdade que só piorou o acesso à saúde, como se o município não tivesse inteligência necessária em nossas universidades para que se pudesse fazer uma boa parceria com o objetivo de estruturar uma rede de atendimento ágil, eficiente e humanizada.  

Mas as reclamações e desgastes não param por aí, basta andar, ouvir e conversar com as pessoas para constatar o desencanto com o aumento do desemprego, a falta de uma rede de combate a fome, o aumento das pessoas em situação de rua… Uma das características do governo Bruno é a centralização, a falta de escuta, a pouca e baixíssima participação social da pluralidade da sociedade campinense. Um exemplo disso é o envio de projetos a Câmara Municipal quase sempre em regime de votação urgentíssima, fazendo com que não haja o debate e diálogo necessários acerca das propostas do executivo na Câmara, e nem  com a sociedade. Quero fazer justiça a alguns bons quadros que estão na administração e tem dado o melhor para que seu governo apresente algo de bom para a cidade. BCL deve agradecer ao Governo Lula pelas portas abertas e pelo diálogo que o ex-presidente e seu aliado negava ao conjunto dos agentes públicos. 

É importante situar o governo Bruno como um governo de continuidade e descontinuidade com governo Romero Rodrigues, e estes dois como parte de um grupo político com o sobrenome Cunha Lima, que já governa o município a mais de três décadas com um intervalo de duas gestões comandadas pelo sobrenome Vital do Rêgo. Por mais que Bruno seja a versão de direita e bolsonarista do grupo Cunha Lima, seu governo não pode ser separado dessa continuidade de um grupo político que desde que assumiu os rumos da administração municipal tem feito os índices sociais, ambientais e econômicos só piorarem e como consequência, temos cada vez mais um município com maior concentração de riqueza e maior desigualdade social, uma economia quase estagnada e que não consegue apresentar um novo dinamismo para um novo ciclo de desenvolvimento.  

Parte das reclamações da ineficiência do governo Bruno, vem desde Romero Rodrigues. A diferença entre os dois é muito mais pelo trato e pela  capacidade de diálogo que Bruno não tem, basta ouvir muitos dos seus aliados e ver a forma bem mais centralizadora de Bruno, em comparação com Romero. Porém, do ponto de vista administrativo o governo de Romero foi muito ruim para a cidade, com pouco planejamento, a exemplo do atraso da revisão do plano diretor e da baixíssima aplicação dos poucos planos setoriais que andaram na sua gestão e do quase fechamento do morimbundo orçamento participativo, das cozinhas e restaurantes populares fechados …

omero e Bruno são faces da mesma moeda. Por mais que alguns não queiram, por mais que nos bastidores a convivência entre Bruno e Romero não seja das melhores, não há muita diferença política e administrativa entre eles. É preciso superá-los. Outra diferença é o fato de Bruno ser um bolsonarista convicto e Romero um bolsonarista de ocasião. A maior propaganda de Romero é o Aluízio Campos, projeto executado no Minha Casa Minha Vida, durante os governos do PT, mais especificamente no governo Dilma. Por mais que eu tenha críticas à forma do Minha Casa Minha Vida, foi uma ação dos governos do PT no município. Muda a conjuntura e  o que faz Romero?

Abraça um governo de extrema-direita, com uma agenda contra a democracia e contra as políticas de justiça social e vota em Bolsonaro, que foi derrotado eleitoralmente no município, foi a melhor resposta a Bruno e Romero nas eleições de 2022. 
Outra questão a abordar é o diálogo entre as oposições ao governo BCL, entendemos que essa oposição ela vai da esquerda, passa pelo centro e vai  até a setores da direita, então é uma oposição plural e portanto com projetos distintos, mas a ação unitária de oposição ao governo BCL precisa ser fortalecida e construída no dia a dia. 


Outro fato a se analisar é que nos últimos 46 anos a administração municipal se divide em três sobrenomes: Ribeiro, Cunha Lima (com o maior tempo) e Vital do Rêgo, três grupos  políticos que dominam a política campinense desde então e por outras vezes a política estadual. Com uma curtíssima passagem do PT com Cozete Barbosa como prefeita, que teve um governo sem poder político e administrativo,  que sucedeu o então prefeito Cássio Cunha Lima. Vale uma boa avaliação dessa aliança, (PMDB/Cunha Lima com o PT) que a meu ver contribuiu para fragmentar o campo das esquerdas e adiar um projeto popular e de esquerda para o município, mas isso será tema de outro texto. 

Um Projeto de Esquerda, Centro-Esquerda e Popular, é possível? 

É possível e necessário, Campina Grande é um dos poucos municípios de porte médio que ainda não teve um partido de esquerda ou de centro esquerda que chegou à prefeitura pelo voto direto, está mais do que na hora de construirmos essa possibilidade eleitoral para o município. 

Campina Grande sempre contou com uma pluralidade de organizações de esquerdas e centro-esquerdas, de partidos políticos, a movimentos sociais, sindicais, comunitários, sempre contou com uma sociedade civil organizada com os seus altos e baixos, mas sempre experimentou essa pluralidade organizativa.

Do ponto de vista eleitoral, desde o final dos anos 1980 e os anos de 1990, experimentou-se o que eu chamo de subida da ladeira, ou seja os partidos de esquerda, eleição pós eleição, subiam o número de eleitores/as em Campina Grande, com destaque para o Partido dos Trabalhadores (PT), onde as suas candidaturas a prefeitura de 1988, com o advogado Jairo Oliveira, em 1992, com o economista e sindicalista e ex-vereador Antônio Pereira, e em 1998 com o professor Edgar Malagodi, tiveram votações crescentes, o que apontava a possibilidade real do PT chegar à prefeitura. Com a aliança do PT com o então PMDB Cunha Lima, no ano de 2000, essa subida é interrompida. Com isso há a fragmentação e crise nas esquerdas, e o sentimento de mudança e a vontade de derrotar Cunha Lima acabam recaindo na candidatura de Veneziano Vital Do Rêgo, em 2004, onde saiu vencedor.  Mas isso é para um outro texto como já falei acima. 

A primeira década do século XXI, e a segunda década, são marcadas por esses dois grupos e pela adesão do grupo Ribeiro/PP ao grupo Cunha Lima, o que facilitou a vitória do BCL em 2020. Destaco a participação do PSOL como partido de esquerda nas disputas eleitorais deste período, tanto com Sizenando Leal, Davi Lobão e Olímpio Rocha. 

Em 2016, as esquerdas ensaiaram uma unidade que logo se desfez diante da conjuntura da época e da ação do então Governador Ricardo Coutinho, em apoio a candidatura de Adriano Galdino. Mas as eleições de 2018, sobretudo a ação articulada no segundo turno, onde conseguimos elevar a votação em Fernando Haddad (PT), despertou a urgente demanda de unidade do campo das esquerdas e progressistas de Campina. Com isso, em 2019, formalizamos a criação do Fórum Pró-Campina, como este espaço de articulação, convivência e diálogo em vistas de um novo projeto político para Campina Grande, com a finalidade de defender e aprofundar a democracia, conhecer a realidade e propor uma agenda de mudanças para o município.

Passamos pela eleição municipal de 2020 sem nenhum partido de esquerda e centro-esquerda coligado ou apoiando alguma candidatura dos grupos tradicionais da cidade. Tivemos duas candidaturas com o mesmo programa e com o mesmo compromisso de unidade, que foi expressado pelo PSOL, com advogado e militante Olímpio Rocha, e com o deputado Inácio Falcão, pelo PCdoB. 
A eleição de 2022 foi outro momento que ajudou a crescer a consciência da unidade, o Fórum Pró-Campina iniciou o Movimento Pró-Lula, que cresceu e foi além dos partidos e dos movimentos sociais, consagrando a vitória da democracia e de Lula presidente no primeiro e segundo turno em Campina Grande. Demonstrando que é possível o voto de esquerda, de centro-esquerda e progressista, crescer no município.  

Agora é hora de seguirmos em unidade, conversando, construindo, convencendo, e não abrirmos mão do protagonismo. É hora de uma candidatura que represente um novo projeto político das esquerdas e democrático popular para o diálogo com os/as cidadãos/as campinenses. Não podemos abrir mão, sob hipótese alguma, de nos apresentarmos como uma alternativa política em 2024, mirando um futuro próximo de governar Campina Grande, e este dia passa pelas eleições do ano que vem. Queremos chegar ao palácio do bispo para mudar as coisas, para mudar essa cidade, para um ciclo democrático e popular que faça a justiça social e ambiental serem a nova fase do seu desenvolvimento.

Claro, que uma etapa importante é a disputa para o legislativo municipal, precisamos ampliar a bancada de esquerda e centro-esquerda na Câmara. Cada partido, desde já, deve construir e articular as suas listas para o legislativo, pensarmos as boas estratégias para uma campanha vitoriosa rumo a Câmara Municipal. Atualmente só contamos com a aguerrida e combate Jô Oliveira, primeira mulher negra vereadora, que tem crescido como uma nova protagonista do nosso campo, não apenas em Campina, mas em todo o Estado( seu nome é colocado por várias pessoas que desejam tê-la na disputa pela prefeitura). Também contamos com o vereador Anderson Pila, que tem a sua origem no PCdoB, e mantém uma honrosa atuação dentro do nosso campo na Câmara.  

Muito se pergunta por nomes. qual nome vai disputar? Nomes não faltam, e cada partido que compõe o Fórum Pró-Campina, tem liberdade e deve apresentar os seus nomes. Aqui cito os nomes já apresentados na Plenária do Fŕoum e os mais recentes: André Ribeiro pelo PDT, o Dep. Estadual Inácio Falcão pelo PCdoB, o Secretário de Saúde do Estado Jhony Bezerra pelo PSB, o advogado Popular Olímpio Rocha pelo PSOL e professor Márcio Caniello pelo PT, outros nomes poderão ser lançados pelos partidos. Buscar o diálogo com a UP e outros setores mais à esquerda para os consensos necessários, em vista de uma nova etapa da vida política de Campina Grande. 

O nome deve representar o projeto, oxalá que nessa caminhada de escutas e diálogos, possamos ir construindo programa e uma candidatura que una os nossos partidos. Claro que a decisão de candidatura é dos partidos, mas é importante que vá além dos partidos, dialogando com os movimentos sociais, sindicais, com as juventudes e com aqueles/as que não estão nos partidos, mas que querem participar dessa empreitada. É hora, repito, de construção do novo Projeto Político de esquerda, que seja radicalmente democrático, popular comprometido com a busca da igualdade, reconhecendo a nossa diversidade, de alma antirracista e conectado com uma nova economia sustentável e justa. 

É hora de subir a ladeira!
É preciso olhar longe, olhar o futuro andando pelo presente. 
Democracia, participação, igualdade, diversidade e sustentabilidade. 
Só será possível com muita participação, convivência,  compromisso, confiança mútua, sinceridade e muito diálogo. 
Que Campina Grande seja, de fato, para todas e todos, a capital do trabalho e da paz, assim como cantamos em seu hino.
 
Caminhemos!

Roberto Jefferson Normando tem formação em Filosofia, é Coordenador do Fórum Pró-Campina e Membro da Direção Estadual do PSOL - Paraíba. 


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Edição: Cida Alves