Paraíba

FISCALIZAÇÃO

Inquérito civil aponta falta de transparência da PMJP sobre licitação para obras de alargamento

MPF enviou para o Ministério Público de Contas da Paraíba (MPC) cópia do inquérito para investigação

Brasil de Fato | João Pessoa - PB |
Reunião com o Ministério Público de Contas da Paraíba (MPC) - Imagem: Ascom Cida Ramos

O Ministério Público Federal (MPF) enviou para o Ministério Público de Contas da Paraíba (MPC) cópia do inquérito civil que apura o processo de alargamento da faixa de praia de João Pessoa (PB). O encaminhamento é decorrência da resposta da prefeitura da capital à solicitação de informações do órgão ministerial sobre licitação que contratou empresa para realizar estudos e projetos concernentes à engorda da faixa de praia na capital.

O (MPF) abriu um inquérito civil, no início de maio deste ano, para apurar o processo do projeto de alargamento da orla de João Pessoa, anunciado pela prefeitura em fevereiro deste ano. Na ocasião, o procurador João Raphael Lima Sousa disse que a prefeitura de João Pessoa (PMJP) não prestou ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) informações necessárias sobre as ações já realizadas em relação à proposta de engorda da praia.

Para o MPF, se a prefeitura tivesse adotado uma postura transparente também teria sido possível obter contribuições valiosas de setores relevantes da sociedade civil

Após a resposta da gestão municipal, o MPF emitiu despacho decisório, nesta segunda-feira (22). O órgão registra que a prefeitura poderia ter adotado uma postura mais receptiva ao diálogo, a fim de reconsiderar parte de seu procedimento e refazer o processo de licitação de forma adequada e transparente, corrigindo distorções que prejudicam a competitividade e, consequentemente, garantindo a proteção do meio ambiente e os direitos das atuais e futuras gerações.

Reunião com parlamentar e ambientalistas

Uma reunião envolvendo o Ministério Público de Contas da Paraíba (MPC), a deputada Cida Ramos (PT), especialistas e ambientalistas aconteceu na manhã desta terça-feira (23) acerca da decisão da Prefeitura de João Pessoa em dar prosseguimento ao projeto de engorda da orla das praias de João Pessoa.

Além do Procurador Marcílio Franca (MPC ) estiveram presentes na discussão os auditores/a Renata Diniz, Elkson Miranda e Rômulo Araújo; o Representante da Rede e ONGs Ambientais da Paraíba, Ivaldo; a Presidenta da APAN e professora Paula Frassinete; os professores/as: Saulo Vital, Rossana Honorato, Rogério Ferreira, Cristiane Costa, Ricardo Rosa; e a ativista Larissa.

Para o professor Saulo Vital, do departamento de Geociência da UFPB, não tem sentido promover qualquer alargamento de praia antes de resolver problemas mais básicos existentes nas áreas em questão. “Realizar a engorda de praia é como tentar parar uma hemorragia interna por fora”, compara.

Andrea Porto-Sales, do departamento de Geografia da UFPB, comenta: "Um plano de ação exige a definição de uma governança que envolva tomadores de decisão do estado, da região metropolitana e gestores municipais com participação ativa e abrangente da sociedade civil. Isso não está contemplado neste plano, além de não ter convergência com as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) do Brasil no acordo de Paris.

::REJEIÇÃO | Movimentos Sociais se opõem ao alargamento da orla de João Pessoa. Entenda o caso - A previsão é de que serão investidos R$ 200 milhões para o alargamento da orla da capital

O Procurador, Marcílio Franca, expôs que no órgão já tramitam dois processos sobre o alargamento para ter acesso aos documentos licitatórios e mais informações sobre o caso. 

Os professores e representantes das ONGs apresentaram, a partir de suas áreas de pesquisas, diversos pontos sobre os prejuízos que podem ocorrer caso a obra aconteça - a maioria dos prejuízos será de forma irreversível. Também foram explanados os prejuízos sociais, a qualidade de vida dos pessoenses e paraibanos, diante da perda de uma orla acessível e de beleza cênica incomparável.

“A gente participou de uma reunião com o Dr Marcílio, que é do Ministério Público e do Tribunal de Contas Estadual, além de várias entidades ambientalistas, conversamos muito e pusemos os vários técnicas especialistas do Comitê Científico da UFPB para explicar os efeitos e a degradação que a engorda da praia vai gerar a nossa natureza, na nossa orla e para o povo paraibano. Os aspectos, do ponto de vista científico, biológico e sociais foram todos explanados, estamos na luta e ela está só começando, agora com força, mobilização e o jurídico também”, declarou a deputada Cida Ramos

Para o MPF, se a prefeitura tivesse adotado uma postura transparente, também teria sido possível obter contribuições valiosas de setores relevantes da sociedade civil na elaboração dos requisitos técnicos que orientaram o processo de licitação e estão sendo utilizados nos estudos realizados pela empresa contratada.

No despacho decisório, o MPF registra que é preocupante a pressa demonstrada publicamente pela Administração municipal em concluir os estudos em prazo muito curto, de pouco mais de três meses, sem realizar coleta de dados primários atualizados.

Especialistas em oceanografia afirmam que um estudo desse tipo deveria ser mais abrangente, levando em consideração dados coletados diretamente ao longo de, pelo menos, um ano, e não apenas usando informações secundárias. Isso evitaria que futuras decisões administrativas fossem baseadas em estudos encomendados às pressas, já que os danos ao meio ambiente são irreversíveis, registra o despacho.

Precaução ambiental 

No documento, o Ministério Público Federal invoca o princípio da precaução ambiental, que significa que, quando há dúvidas sobre os possíveis impactos negativos de uma ação no meio ambiente, deve-se adotar a decisão mais conservadora, evitando ações imediatistas. Para o MPF, realizar estudos em pouco mais de três meses, sem coleta ou atualização de dados pela empresa contratada para elaborar o masterplan do alargamento da faixa de praia de João Pessoa, está longe de ser uma abordagem conservadora quando se trata da proteção do meio ambiente.

Entenda o caso

O prefeito Cícero Lucena (PP), anunciou no último dia 07 de fevereiro que irá fazer o alargamento da orla de João Pessoa. No projeto, está prevista uma pista viária ligando o Cabo Branco à Ponta do Seixas por baixo, contornando a Falésia do Cabo Branco.

Estudos técnicos já estariam em curso e a previsão é de que as obras sejam iniciadas já em dezembro de 2023.

A ideia de uma pista contornando a falésia vem desde 2004, quando Cícero ainda era prefeito da capital.

Na Câmara Municipal de João Pessoa, recentemente, o prefeito declarou: "Vai ter também papel de estabilizar e evitar que o mar bata na barreira do Cabo Branco. Mas isso não será um projeto isolado. Ele também terá a oportunidade de reconstruir a barreira. Nós vamos estabilizar a barreira e reconstruir parte dela".

As áreas de alargamento compreendem: praias de Bessa, Manaíra, Ponta do Seixas (Falésia do Cabo Branco) e Jacarapé (Polo Turístico). Além da Falésia, o projeto pretende alargar toda a faixa da praia de Manaíra, entre o Hotel Tambaú e o Mag Shopping, e ainda a área do Caribessa. Para isso, as areias serão colhidas no fundo do mar.

Em Manaíra, o projeto prevê a construção de uma terceira via na avenida paralela à praia, o alargamento da calçadinha e a transferência da ciclovia para depois da calçada. Uma Marina em Tambaú, nas proximidades de onde está o Mercado de Peixe, também é um dos itens contidos no plano.

Ele explica, por fim, que a etapa de engorda é apenas a primeira etapa de todo o processo, e que esta deve começar em dezembro e durar 90 dias. Depois, seria iniciada a parte de urbanização.

A Prefeitura de João Pessoa contratou a empresa Alleanza Projetos e Consultoria Ltda para desenvolver o projeto de alargamento da faixa de areia em praias da Capital. O valor do contrato é de R$ 275.502,40 e o Termo especifica que a empresa deverá elaborar “um masterplan (projeto conceitual) de proteção costeira e urbanização, incluindo estudos e modelagens numéricas e anteprojetos de engenharia para redução do processo de erosão costeira”.

O objetivo, segundo o documento, é “permitir o uso contínuo da praia por turistas e banhistas locais, bem como proteger as infraestruturas existentes e reestabelecer dunas e vegetações costeiras”.

A obra terá um custo de cerca de R$ 200 milhões, e ainda contará com recurso estadual: as obras de reurbanização da cidade custariam R$ 400 milhões, sendo que desse valor de R$ 240 milhões sairiam do Estado e R$ 160 milhões da Prefeitura. 

O prefeito acrescentou que esse valor não inclui apenas as obras na orla, mas também parques públicos nos bairros de Aeroclube, Bancários e Cuiá.

No entanto, segundo informações, a experiência de Balneário Camboriú (SC) com o alargamento da faixa de área do seu litoral não tem sido boa. Em um ano, o litoral catarinense já registra nível máximo de coliforme fecais no mar e a morte de colônias de animais marinhos.

Uma página gerenciada por ativistas e ambientalistas com mais informacoes pode ser acessada aqui: https://www.alargamentonao.minhajampa.org.br/
 

 Em live, a professora Flávia Lins, do departamento de Geografia da UFRJ e o professor Marcus Polette da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI falam sobre o engordamento da praia de Copacabana (RJ) -  alterações geomorfológicas e reflexões críticas
e fazem avaliação do processo de desenvolvimento urbano em Balneário Camboriú - SC

 

 

 

Edição: Cida Alves