Paraíba

Coluna

Agricultura familiar e alimentação saudável voltam a ter voz na Política Externa Brasileira

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Lula na recriação do PAA - Ricardo Stuckert
A CAMEX é o espaço onde se discutem políticas de comércio exterior e as posições do Brasil nas NEI's

POR THIAGO LIMA*

O MDA foi recriado pelo governo Lula, agora com o nome de Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, e foi reinstaurado na Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) do Ministério da Economia. A CAMEX é o espaço onde se discutem políticas de comércio exterior e as posições do Brasil nas negociações econômicas internacionais. Isso é um passo importante para reverter os efeitos do "Agrogolpe" que tirou a ex-presidente Dilma Rousseff do poder no campo da Política Externa. Afinal, uma das agendas do grupo que assumiu o governo com Michel Temer era justamente silenciar as vozes da agricultura familiar – especialmente a do campesinato – e de setores ligados à produção e consumo de alimentos saudáveis que desafiassem a hegemonia do grande agronegócio. 

Para isso, os governos Temer e Bolsonaro desmantelaram instituições e agências que cuidavam da agricultura familiar e da alimentação saudável, incluindo o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e o próprio MDA. Eles também reduziram o orçamento para políticas públicas vitais para a pequena produção agrícola e para a promoção da saúde alimentar, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar, o Programa de Aquisição de Alimentos e o Programa de Cisternas, que guarda a água da chuva nas regiões mais secas.

Entretanto, o sufocamento nacional de iniciativas exitosas que compunham o grande leque do Fome Zero não era suficiente. Era preciso também apagar a imagem internacional do Brasil como um país que dava voz e voto à agricultura familiar e à alimentação saudável como formas de promoção de justiça social. Por isso, Temer e Bolsonaro eliminaram o MDA e o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), que participavam da Política Externa Brasileira e, mais especificamente, o setor do Itamaraty que dava voz ao Fome Zero no mundo: a Coordenação-Geral de Cooperação Humanitária e Combate à Fome (CGFome).

Buscando reverter esse quadro, o terceiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva retoma aquilo que havia sido uma grande inovação histórica da sua primeira passagem na presidência: conceder voz e voto ao campesinato e aos representantes da comida saudável no processo de formulação de Política Externa Brasileira. É isso o que o MDA poderá fazer na CAMEX. Na ausência do MDA, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) era a única voz da agricultura naquela Câmara, o que obviamente não é representativo da realidade brasileira. Agora, além do MDA, o governo Lula criou a Coordenação-Geral de Segurança Alimentar (CGSA), no Ministério das Relações Exteriores, e a Coordenação de Agricultura Familiar na Agência Brasileira de Cooperação (ABC). Este fortalecimento institucional aponta para a internacionalização do combate à fome.

Estes são feitos da maior relevância em um país cuja trajetória é marcada pela escravidão, pelo racismo, pela violência contra os povos do campo e das águas, e pela imposição da fome sobre o povo. Essas ações demonstram – em tese! – o comprometimento do governo com a segurança alimentar e a valorização da agricultura familiar como forma de promover o desenvolvimento sustentável e combater a fome no Brasil e no mundo. É uma mudança significativa em relação aos governos anteriores, que não apenas desmantelaram essas instituições e priorizaram os interesses do grande agronegócio em detrimento da saúde e do bem-estar da população, mas que também buscaram silenciar, para o mundo, as soluções criativas e eficientes que o Brasil construiu para alimentar as pessoas com a produção da agricultura familiar.

Agora devemos observar, criticamente, se estas novas instituições conseguirão, de fato, impactar a Diplomacia, a Política Externa e as Relações Internacionais do Brasil numa direção que contribua para o fim da fome, no país e no mundo, por meio da alimentação saudável e promovendo o desenvolvimento social dos povos do campo e das águas. 

*Thiago Lima – Membro do Instituto Fome Zero (ifz.org.br) e Coordenador do Grupo de Pesquisa sobre Fome e Relações Internacionais da UFPB (fomeri.org)

Edição: Polyanna Gomes