Paraíba

Coluna

Março passou. No mês das mulheres, onde estão as mulheres de terreiro?

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Ilustração - Arquivo pessoal
...as mulheres de terreiro exercem funções sociais que vão de encontro à lógica ocidental

 

Voltamos! O presente texto representa nosso retorno à coluna do Brasil de Fato, dessa vez nosso objetivo é marcar o mês de março, como mês de invisibilidade das mulheres de terreiro da Paraíba. Enfatizamos a presença e a importância do matriarcado nas religiões de matriz africana e afro-indígena.
O 8 de março marca historicamente as lutas e reivindicações das mulheres no mundo ocidental. Com isso, nos questionamos qual o lugar que as mulheres de terreiro ocupam no 8 de março? Partimos dos estudos de Oyěwùmí quando afirma que a divisão biológica criada pelo ocidente galgou algo muito cruel – deu às mulheres um corpo enquanto os homens são mentes – capazes, portanto, de criarem, evoluírem e serem reconhecidos como humanos.
É nesse universo extremamente cruel que as mulheres de terreiro estão inseridas. O que torna ainda mais desafiador seu papel na sociedade e em suas comunidades religiosas. Os seus corpos não representam apenas o existir e suas histórias, lutas e resistências, apesar de invisibilizadas, compreendem as lutas históricas das mulheres no Brasil.
Com isso, reafirmamos, ao evocar os estudos Oyěwùmí, que as mulheres de terreiro exercem funções sociais que vão de encontro à lógica ocidental do gênero, visto que as relações sociais nos terreiros não estão determinadas pelo aspecto biológico. As mulheres exercem diferentes atividades, não apenas de adeptas, contribuem em diversas atividades, incluindo o papel de lideranças dos terreiros e pautando, no seio na sociedade, seus direitos e reivindicações.
Diante disso, questionamos: onde estão as mulheres de terreiro da Paraíba? Quais espaços sociais elas ocupam? Além da gigantesca tarefa de servir e gerir seus terreiros, quais outros espaços políticos têm tomado? Como acessam aos seus direitos individuais e coletivos? As políticas sociais promovidas pelos municípios e pela gestão estadual conseguem abranger as demandas postas por essas mulheres? 
A resposta, pelo menos para esta última pergunta, nos parece ser um inquietante não. Se pegarmos os dados do Cadastramento socioeconômico e cultural de Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana e/ou Comunidades Tradicionais de Terreiro de 2020, realizado pela Casa de Cultura Yle Axé de Oxaguiã e o Instituto IPPECET, 47% das lideranças religiosas entrevistadas são mulheres.
Apesar do referido Cadastramento não mencionar a identidade de gênero e orientação sexual das entrevistadas, ainda segue como uma fonte para conhecermos as mulheres de terreiro da região metropolitana de João Pessoa/PB. O que nos remonta às perguntas já elencadas, porque, apesar dos dados apresentados pelo referido cadastramento, além de não identificar identidade de gênero e orientação sexual das mulheres entrevistadas, também não há uma identificação sobre o quesito raça/cor. 
Essas lacunas só reforçam nossa premissa: há uma invisibilidade das mulheres terreiro, mesmo em ações e políticas voltadas para elas. O que, por fim, amplia a gama de perguntas sobre o acesso aos direitos individuais e coletivos, o reconhecimento social e política dessas lideranças e, principalmente, a promoção de ações de enfrentamento ao racismo.  

Por Elisabete Vitorino e colaboração de Aldenor Souza;
 

Edição: Cida Alves