Rio Grande do Sul

LUTO

Dia dos Pais será difícil para 113 mil órfãos brasileiros deixados pela covid-19

“Que país a gente quer para essas crianças?”, questiona o advogado Gustavo Bernardes, presidente da AVICO Brasil

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Um estudo da revista médica inglesa The Lancet indica que 113 mil crianças ou adolescentes do Brasil perderam, ao menos, um dos pais devido à covid-19 - Reprodução/Michael Appleton/Fotos Públicas

Um estudo da revista médica inglesa The Lancet indica que 113 mil crianças ou adolescentes do Brasil perderam, ao menos, um dos pais devido à covid-19. Delas, 87,5 mil ficaram órfãs de pai, 25,6 mil de mãe e 13 mil perderam pai e mãe. Além disso, 17 mil perderam um dos avós que cuidavam delas e 69 mil perderam ambos.

“As crianças estão pagando um preço enorme nessa pandemia”, diz o advogado Gustavo Bernardes, presidente da Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 – AVICO Brasil. “É importante que, no Dia dos Pais, a gente reflita sobre isso. Que país a gente quer para essas crianças? Como vamos lidar com isso?”, questiona.

“Isto vai ter consequências”, adverte Bernardes. “Não só pela orfandade, mas pela questão escolar. Chegam até nós relatos de crianças com sofrimento psíquico, com medo, com o distanciamento, com a obsessão que a pandemia causa”, enumera. 

“Estado mínimo não combina com pandemia”

Para ele, porém, o pior de tudo é a falta de políticas públicas para acolher crianças e adolescentes tão maltratados. “O Ministério dos Direitos Humanos não tem, o Ministério da Cidadania também não tem. Já questionamos isso e não recebemos nenhum retorno”, critica. E sentencia: “O Estado mínimo não combina com pandemia. Precisa-se de investimento público que não existe”. É algo, para Bernardes, que também impõe uma reflexão dos brasileiros.

E o que a AVICO poderia fazer, agora ou futuramente, em relação ao amparo psicológico desses menores? “Não queremos assumir o papel do Estado. É o Estado que tem de apresentar serviço e acolher essas crianças”, diz. Hoje em dia, a AVICO oferece grupos de apoio para pessoas enlutadas com a participação de profissionais da psicologia voluntários. “Temos uma fila de 500 pessoas para entrar nesses grupos”, conta. 

Oitocentas páginas de relatos de famílias enlutadas

Outra forma de atuação da associação é o apoio jurídico para as vítimas da covid-19. “Temos demandado judicialmente e ajudado o Ministério Público Federal com informação”, explica. A AVICO remeteu ao MPF um documento com mais de 800 páginas contendo relatos de famílias que perderam entes e informações para embasar uma ação que investiga a negligência da União na condução da pandemia. “O principal gestor público – nota, apontando para Jair Bolsonaro – deu declarações, fez ações de sabotagem e deve ser responsabilizado.

“Se o Estado não oferecer (apoio), vamos recorrer ao MPF para obrigá-lo a acolher essas crianças. É preciso pensão, auxílio. Vamos fazer pressão”, promete. 

“Medo é a perda do controle da pandemia”

Bernardes também é uma vítima. Foi internado (e entubado) no final do ano passado e carrega as sequelas oriundas da contaminação pelo coronavírus. Sua parceira na AVICO, Paola Falceta, também foi infectada quando cuidava da mãe internada para uma cirurgia de emergência em março deste ano. Também infectada, a mãe de Paola não resistiu à covid-19. A associação nasceu no dia 8 de abril em Porto Alegre como um coletivo da sociedade civil, integrado por sobreviventes da doença e familiares das vítimas, além de voluntários.

Apesar do recuo de mortes e casos nas últimas semanas, Bernardes acha melhor não baixar a guarda. “A pandemia está mais controlada graças à vacinação, apesar do risco da variante Delta.” Seria melhor “se tivéssemos um governo que fizesse prevenção, feito campanhas, comprado vacinas”. Seu receio é a perda do controle da pandemia. “O que é possível – avalia – considerando-se esse governo que a gente tem.” 

(*) Com informações da Deutsche Welle e Brasil de Fato.


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Edição: Katia Marko