Paraíba

ARTIGO

O que esperar do Orçamento da Paraíba em 2021?

"O que se observa é uma redução generalizada nos gastos entre 2019 e 2020. O motivo principal foi a pandemia"

Brasil de Fato | João Pessoa - PB |
Ilustração - Foto

*Lucas Milanez 

Antes de mais nada, é sempre bom advertir sobre a mistificação que alguns economistas fazem ao afirmar que o orçamento público segue a mesma lógica do orçamento familiar. Não há nada mais perverso ou estúpido a se dizer. Vários são os fatores que mostram esta falácia. Para começar, uma família não pode produzir dinheiro e utilizá-lo para fazer compras (se fizer vai preso por falsificação).

Já um Estado Nacional pode emitir moeda para pagar suas contas (o que não é recomendável em condições normais). Contudo, para um ente da federação, como é o caso do estado da Paraíba (com “e” minúsculo), isto não é possível. A moeda que circula por aqui é o Real, a mesma de todo restante do Brasil e de responsabilidade do Banco Central (instituição cada vez mais surrupiada pela burguesia financeira).

Diante deste cenário, não sabemos o que esperar para o ano de 2021. Por um lado, a Segunda Onda de Covid-19 está se transformando em um tsunami, com efeitos piores que a primeira.

Contudo, um estado (ente da federação) pode atuar na economia de formas bem diferentes das famílias. Primeiro, um governo tem de atender aos interesses dos grupos políticos e econômicos que o apoiaram. Desde movimentos populares às elites locais. Segundo, as compras governamentais têm um impacto infinitamente maior sobre a economia, quando comparamos com os gastos corriqueiros das famílias.

Por exemplo, para realizar uma obra em casa, uma família gasta na loja de material de construção do bairro e, quando muito, contrata alguns poucos pedreiros. Quando um estado resolve expandir um hospital, por exemplo, os gastos são maiores e de qualidade diferente. Para além do material de construção e dos trabalhadores diretamente contratados, uma nova ala de hospital precisa de novos técnicos, enfermeiros, médicos, etc.

O uso do “produto” também é diferente. Uma casa ampliada atende às necessidades de uma única família. Já um hospital atende a toda população.

Trazendo para a realidade local, o quadro abaixo traz as despesas pagas pelo Governo da Paraíba nos dois primeiros anos de mandato de João Azevedo (valores já corrigidos pela inflação). Eles foram agrupados segundo o Programa de Governo.

Despesa orçamentária (paga) segundo o Programa de Governo da PB (em Milhões de R$ de 2020): 2019-2020

O que se observa é uma redução generalizada nos gastos entre 2019 e 2020. O motivo principal, claro, foi a crise gerada pela pandemia de Covid-19. Houve crescimento nos gastos em apenas três Programas: Meio ambiente, recursos hídricos e saneamento (+R$ 86,9 milhões), Serviço da dívida externa (+R$ 0,5 milhão) e Cultura, turismo e esporte e lazer (+R$ 5,7 milhões).

Nos casos dos Programas Paraíba rural sustentável e Promoção da equidade de gênero, racial e de direitos LGBTQI+ não houve gastos em 2019 e houve a inclusão no orçamento de 2020. No total, a queda nas despesas em 2020 foi de cerca de R$ 1,978 bilhões. Este valor é 17,7% menor do que o gasto de 2019.

A tabela também mostra que os gastos do orçamento são bem ecléticos: o dinheiro vai desde o Serviço da Dívida ao Pacto pela juventude, passando por Saúde e Educação. Com isto, vemos que as despesas do setor público são bem diferentes das despesas das famílias. Contudo, são diferentes também suas fontes de recursos.

Podemos observar que a maior parte da receita do orçamento do estado da Paraíba vem de duas fontes: Transferências da União e de suas Entidades (média de 40% do total nos dois anos) e Imposto sobre a Produção

A maior parte das famílias está à mercê dos interesses capitalistas da pior forma: não podem sobreviver sem serem submetidas a um trabalho que lhes extraia o máximo de suor, pagando-lhes o mínimo possível. Com o setor público é diferente. É uma instituição legitimada pelo conjunto da sociedade e a população “aceita” as regras que são estabelecidas por seus representantes (em especial, os representantes das elites).

Para poder funcionar e cumprir seu papel, o Estado precisa extrair das famílias e das empresas uma parte da riqueza gerada. Isto é feito através dos tributos (impostos, taxas, contribuições, etc.). Mas este recolhimento de parte da renda da população também está sujeito às oscilações da economia.

A tabela abaixo mostra a receita orçamentária do estado da Paraíba em 2019 e 2020, também ajustada pelo Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI):


Receita orçamentária do Governo da PB (em Milhões de R$ de 2020): 2019-2020 / Fonte: elaboração própria, a partir dos dados da https://transparencia.pb.gov.br/

Podemos observar que a maior parte da receita do orçamento do estado da Paraíba vem de duas fontes: Transferências da União e de suas Entidades (média de 40% do total nos dois anos) e Imposto sobre a Produção, Circulação de Mercadorias e Serviços (média de 31,1% nos dois anos).

Assim, a principal fonte local de recursos é a produção e a circulação de mercadorias e serviços aqui no estado. O problema é que estamos em meio a uma pandemia que exige (na teoria) o isolamento das pessoas. Isto termina afetando a produção e comercialização de bens. A queda de R$ 759,1 milhões na arrecadação desses impostos entre 2019 e 2020 retrata esta a situação. Na verdade, houve queda generalizada na receita estadual, resultando numa redução de R$ 1,714 bilhões em 2020. O valor é 12,2% menor do que o arrecadado em 2019.

Das poucas rubricas que tiveram aumento no período, destacam-se três: Outras transferências da União (+R$ 753,9 milhões), Transferências de Recursos do SUS - Bloco Custeio (+R$ 152,5 milhões) e Transferências de Convênios da União e de suas Entidades (+R$ 142,3 milhões). Isto significa que o Governo Federal teve um papel importante para reduzir os estragos causados pela pandemia e agravados pela desastrada, descoordenada e genocida política de enfrentamento encabeçada pelo presidente Jair Bolsonaro.

Diante deste cenário, não sabemos o que esperar para o ano de 2021. Por um lado, a Segunda Onda de Covid-19 está se transformando em um tsunami, com efeitos piores que a primeira. Por outro, graças à intencional falta de ação de Bolsonaro e à flagrante incompetência de seus generais no trato da pandemia, estamos longe de começar uma efetiva vacinação em massa.

Para piorar de vez, o anacrônico Ministro da Economia (que abandonou o hábito de pensar ainda na década de 1970) vive dizendo que o Estado não tem dinheiro para nada e que precisa vender tudo.

O resultado é trágico. Não há perspectiva de retomada econômica e muito menos de uma iluminação divina que leve à mudança na política de enfrentamento da pandemia pelo Governo Federal. Resta então à classe trabalhadora se organizar e lutar pela derrubada deste presidente e sua corja. Esta é a única solução para os problemas do orçamento de 2021. À luta!

*Lucas Milanez de Lima Almeida é Professor do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB (Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira - @progebufpb)

 

Edição: Henrique Medeiros e Cida Alves