O combate à violência contra as mulheres deve ser feito pelo poder público e pela população em geral
Diante do cenário pandêmico em que nos encontramos, faz-se ainda mais necessário discutir e combater a problemática da violência contra a mulher. De acordo com a Lei Maria da Penha (Lei n° 11.340/2006), considera-se violência doméstica e familiar “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Isto é, a violência sofrida pela mulher não se limita a agressões físicas; as violências sexuais e psicológicas também se tornam um mal em ciclo na vida das mulheres através de suas relações com os agressores, sendo a maioria deles parceiros ou familiares.
Com a Pandemia, se estabeleceu o isolamento social, porém, as consequências dessa medida são percebidas nos diversos setores da sociedade. Na segurança pública, foi revelado, em estudo, um aumento drástico do número de feminicídios (violência letal), que registrou um salto de 5% desde o começo da pandemia. Em contradição, há uma redução de casos de violência doméstica contra as mulheres em alguns estados brasileiros. Identifica-se que tais reduções se dão como consequência do isolamento social, ou seja, as mulheres vítimas estão impossibilitadas de denunciarem seus agressores, visto que a grande maioria dos casos de violência se dá por parceiros e parentes que convivem na mesma residência da vítima e poucas são as cidades que possuem serviço de atendimento online para registro das ocorrências das agressões sofridas.
Partindo da análise dos dados sobre violência doméstica, podemos destacar também a problemática da violência sobre as mulheres negras e mães, que se inicia na falta do recorte específico no recolhimento de dados nos estudos e na ausência do envio desses dados por parte de alguns estados, dentre eles, a Paraíba. Com o isolamento social estabelecido no início da pandemia, milhares de mulheres perderam seus empregos, seja pela crise financeira instaurada em decorrência do isolamento e da ineficiente gestão federal da crise sanitária, ou pelo fato de que, com as escolas fechadas, as mães não tiveram onde deixar seus filhos(as). Não tendo outra opção, essas mulheres mães tiveram que deixar seus empregos para ficar com os cuidados em tempo integral. A carga dos cuidados dos filhos(as) recai pesadamente sobre as mulheres, são essas as primeiras a perderem seus empregos ou, quando conseguem mantê-los, têm sua carga triplicada.
O desemprego e a crescente condição de vulnerabilidade social corroboraram para os crescentes casos de violência doméstica, que atinge, principalmente, as mulheres e mães negras. Muitas mães, ao perderem empregos, passam a depender financeiramente dos parceiros, o que impossibilita a saída do ambiente onde convive com seus agressores, e continuam sob uma relação de tensão em que o ciclo de violência acaba, na maioria das vezes, em registro de violência letal.
A mulher negra sofre assédio/agressões de forma triplicada, por sua raça, seu gênero e por sua classe social, visto que mulheres negras é a porcentagem maior da população em situação de vulnerabilidade social. A omissão de dados com recortes de raça só dificulta a análise e o combate às violências contra essas mulheres. Sendo elas as principais vítimas de feminicídio, de acordo com os dados do Atlas da Violência 2020, a taxa de mortes de mulheres negras aumentou 12,4% (2017-2018) e, a cada 7,2 segundos, uma mulher é vítima de agressão física no Brasil. Embora tenhamos dados crescentes de notificação de violência contra a mulher nos dias atuais, com a pandemia, esses dados sofrem alterações que nos deixam sem a precisão real dos números, visto que há subnotificação desses registros.
Embora se tenha centros especializados no atendimento à violência contra a mulher e mesmo o corpo de funcionários recebendo capacitação para um atendimento humanizado, ao longo do tempo (após suas implantações) esses centros foram se desvinculando do movimento feminista que estava junto na elaboração de seu projeto. Desde 2015, esses centros vêm sofrendo desmonte. Atualmente, houve redução do valor do orçamento para a Secretaria da Mulher, passando de R$119 milhões para R$5,3 milhões, embora seja urgente a necessidade de se elaborar novas ações de combate à violência e reforço à estrutura já tão frágil e burocrática dos centros.
O combate à violência contra as mulheres também deve ser feito pela população em geral; dessa forma, podemos denunciar os diversos tipos de violência sofrida pelas mulheres. Há canais, sites e aplicativos que podem ajudar nesse combate: através do Disque 180, do Disque 190, do 197 da Polícia Civil, da Promotoria da Mulher do Ministério Público da Paraíba (99168-3629) e do Juntas App, as denúncias podem ser feitas anonimamente.
Por: Karla Maria. Licenciada e mestra em Sociologia, pesquisadora em gêneros e feminismos. Desenvolve trabalhos no terceiro setor, atualmente enquanto articuladora na Pachamamá coletiva de mães
Edição: Henrique Medeiros