Minas Gerais

CRÍTICA

Clipe relaciona história de Adamantina (SP) com alto índice bolsonarista na cidade

Rabay, autor da música “Saudade de Adamantina”, tem sido alvo de ameaças após o lançamento no Youtube

Adamantina (SP) | Brasil de Fato MG |
"Fiz essa música para que os poderosos entendam que existem outras vozes" - Créditos: divulgação

O videoclipe “Saudade de Adamantina”, lançado no Yotube em 25 de outubro, está causando polêmica na cidade de Adamantina (SP). A música reconta a história da cidade paulistana relacionando a sua história com o alto índice de eleitores bolsonaristas (82% dos votos válidos no segundo turno de 2018). Menos de 48 horas após sua publicação, o vídeo atingiu quase 3 mil visualizações e angariou uma série de ofensas ao cantor e compositor.

A música, de Rabay, começa relembrando o genocídio indígena que ocorreu em Adamantina (SP) e que deu origem à cidade. Segundo historiadores, entre eles o etno-ecólogo Dafran Macario, o Planalto Ocidental Paulista era habitado por diversos grupos indígenas que foram massacrados por exércitos “bugreiros”, financiados por especuladores de novas terras e pelo governo do Estado. Sendo os kaingangs-paulistas a principal etnia massacrada neste processo.

Música relembra genocídio indígena que deu origem a cidade e racismo contra um padre do local

“Se você abre a página sobre Adamantina, ou qualquer outra cidade da região no Wikipedia, a informação que consta é que a cidade tem 70 anos, como se tivesse surgido do nada. Mas a verdade é que há 70 anos (o que é muito pouco tempo) ocorreu o massacre de uma população indígena que ocupava a localidade há mais de 300 anos”, observa o compositor da música Samuel Rabay.

Além do genocídio indígena, o videoclipe aborda fatos mais recentes, como, por exemplo, o caso do Padre Wilson Luís Ramos, que é negro, e foi afastado de uma paróquia adamantinense por motivações racistas. “Ainda outro dia flagrei duas senhoras na frente da igreja comentando que deveriam trocar o galo que está lá em cima, na cúpula, por um urubu”, revelou o padre ao Catraca Livre, em 2014.

Repercussão

As mais de 6 mil visualizações orgânicas em uma semana é expressiva em se tratando de uma cidade com cerca de 30 mil habitantes.

Uma postagem em um grupo da cidade no Facebook chegou a cerca de 200 reações e 400 comentários, palco de ofensas e ameaças ao artista. Internautas o chamam de uma série de termos pejorativos, com comentários sobre seu cabelo cacheado e o associam ao Partido dos Trabalhadores (PT). Entre as ofensas, comentários com homenagens à ditadura militar, falas anti-vacina e exaltações acaloradas a Jair Bolsonaro. 

Alguns ameaçam ainda processar Rabay por danos morais, por terem se sentido atingidos pelas críticas ao conservadorismo da cidade.

Quem é ele?

Samuel Rabay tem 27 anos e faz música desde os 17. É filho de paraibanos e formado em Comunicação Social (Jornalismo) pela Universidade Federal de São João Del Rei. Morou em Adiamantina por 3 anos, onde trabalhou como artivista e educomunicador em um hospital público municipal. Quanto à vinculação política, o compositor afirma que não é filiado a nenhum partido.

Em 2020, antes do single “Saudade de Adamantina”, Rabay lançou o álbum visual autoral Mutibirutista Raitéqui, que pode ser encontrado no seu canal do youtube.

Por que compor essa música?

Um dos motivos mais fortes relatado pelo artista é a necessidade de se expressar.

“Depois de morar 3 anos na periferia de uma cidade extremamente conservadora, eu precisava desabafar sobre os olhares que eu sentia com relação ao meu trabalho, à minha figura. Fiz essa música também para provocar os poderosos que durante três anos eu fui obrigado a ouvir vomitar ódio. Para eles entenderem que existem outras vozes e que essas vozes não têm medo deles”, conta Rabay.

Apesar de todas as ofensas, ele se diz feliz com o resultado e em poder contribuir para a história da região. A produção, feita de forma independente, foi gravada na casa do músico, na periferia da cidade e no centro, foi roteirizado e editado pelo próprio artista e conta com imagens de Taisa Maria (@exerciciofotografico).

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Edição: Elis Almeida