Paraíba

PARTIU O POETA

Paraíba se despede do mestre forrozeiro Pinto do Acordeon

Uma das maiores lendas do verdadeiro forró nordestino parte aos 71 anos de complicações decorrentes de uma diabetes

Brasil de Fato | João Pessoa - PB |
Minha terra tem tanto poeta / Poesia faz parte de mim / A sanfona sempre foi minha dona / Me conhece tim tim por tim tim - Card: Reprodução

Uma triste notícia rasgou ao meio o dia do povo paraibano. Na madrugada desta terça-feira (21), partiu uma das maiores lendas do verdadeiro forró nordestino, Pinto do Acordeon, aos 71 anos, de complicações decorrentes de uma diabetes que acabou provocando insuficiência renal e um câncer na bexiga. 

Francisco Ferreira de Lima, artisticamente conhecido no mundo inteiro como Pinto do Acordeon, nasceu em 18 de fevereiro de 1950, na cidade de Conceição, Sertão da Paraíba.

O cantor forrozeiro esteve internado no Hospital da Beneficência Portuguesa onde fazia o tratamento contra a doença, mas foi liberado para ficar no apartamento de uma filha, que mora em SP, onde continuava o tratamento.


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A doença se agravou demais e Pinto não resistiu às complicações e acabou falecendo, por volta das 2hs da madrugada desta terça-feira (21)

Seu contemporâneo Flávio José escreveu nas redes sociais: “Pinto não se foi. E estará sempre presente nas lembranças de suas canções, seus causos, sua alegria, seu humor contagiante, sua sanfona, sua voz forte de um sertanejo, nas letras abordando temas diversos e na amizade que se eterniza. Um artista diferenciado e um dos mais autênticos herdeiros musicais do Rei do Baião. Um amigo na essência da palavra. Como ele costumava dizer: ‘o artista nunca morre e na sua cova nascerá um pé de flor’. Deus esteja com você”. - Ronaldo Queiroga

O cantor de Neném de Mulher deixou um epitáfio, o qual foi postado na sua página @pintodoacordeonofc: “Um artista nunca morre, na sua cova nasce um pé de flor”

“O céu hoje recebe uma grande estrela, foi-se mestre Gonzaga, foi-se  mestre Sivuca, foi-se mestre Domingos e agora o céu recebe esse grande ídolo, Pinto do Acordeon que estará eternizado em nossos corações e em sua grande obra. Descanse em paz”

Também forrozeiro, seu filho Mo Lima (@molima_oficial), postou um vídeo com os últimos gestos, segurando a mão do seu pai e escreveu: “Adeus meu pai… soltasse a minha mão para segurar na de Deus! Agora é justo o teu descansar… Te amo para todo o existir da minha alma”


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O cantor Ton Oliveira dedicou: “Vá com Deus, meu cantador dos sertões!”

Mestre reconhecido por toda a linhagem de forrozeiros novos e antigos

Francisco Ferreira de Lima ou, simplesmente, Pinto do Acordeon, nasceu em Conceição, no Vale do Piancó, em 18 de fevereiro de 1948. O filho de Francisco Moreno e Dona Josefa, que ainda criança despertou para o mundo da música e, aos 13 anos, já fazia forró na sua região, fez dos estudos iniciais até o curso de admissão em sua terra natal e foi colega da conterrânea Elba Ramalho.
 Foi à dificuldade de sobrevivência da família, com uma prole de doze irmãos, que a trouxe a Patos no ano de 1964. Aqui chegando, o “Nêgo Pinto”, como era mais conhecido, com o aval de Wilson Braga, conseguiu comprar uma sanfona ao empresário Cazuza. Os primeiros bailes sertanejos foram tocados no Circulo Operário, concorrendo com Agamenon Borges, o melhor sanfoneiro da época. Para ele, viver no Sertão não foi fácil. Dos membros da família surgiram os integrantes do grupo musical com a meta inicial de conseguir o sustento, enquanto vislumbravam novos horizontes de sucesso.
 Nas campanhas eleitorais, “Pinto do Acordeon”, passou a ser um dos mais solicitados, chegando a tocar para a situação e oposição. Uma de suas particularidades residia nas letras e improviso que, na maioria dos casos, com termos cômicos, conseguia rebaixar o opositor do contratante e, no dia seguinte, mediante nova contratação, enaltecê-lo, desmanchando o que fizera anteriormente. 
 Não menos guerreiro que o filho tocador, Francisco Moreno e dono Josefa tocavam o ofício de artesão para o complemento das despesas. Em 1968, Pinto conhece a jovem Madalena Alves Figueiredo, membro da tradicional família Pedra de Santa Terezinha, durante um baile na localidade conhecida por Mata-Burros, um dos bairros da cidade de Patos. A troca de olhares decretou o namoro e, em 1972, o casamento, na Igreja de Nossa Senhora de Fátima, no bairro Belo Horizonte.
 Outro lado interessante do artista reside no campo folclórico. Festeiro, como sempre foi, certa noite entrou na bebedeira com diversos amigos e, lá pelas tantas, preocupado com o avançar da hora, com medo de represália da recém esposa ensaiou uma saída, sob a alegação de que Madalena estava sozinha. Edvaldo Motta, um dos mais assíduos parceiros, pediu que demorasse e tocasse mais um pouco, lhe dando uma justificativa plausível: “Você diz a ela que agente estava no velório do maestro Edson Morais”. Surpreso com a notícia, que inclusive constava da hora do enterro concordou e, ao chegar em casa as 4h, no momento em que era questionado, fez o relato e combinou a ida ao sepultamento. Por volta das 9h seguiu com a companheira à residência do “saudoso”, onde foi cumprimentado por ele, que se encontrava saudável e cheio de vida, o que originou o primeiro grande barraco da vida matrimonial.
 Voltando ao lado artístico, o maior trunfo na vida de “Pinto do Acordeon” foi o fato de ter conhecido e ganhado a simpatia de Luiz Gonzaga, graças ao prestígio do empresário Gabriel Luiz Gomes (Gabi do Fumo Dubom), compadre e amigo pessoal do artista nacional. Com o Rei do Baião teve a oportunidade de se apresentar, por diversas vezes, pelo Brasil afora. Por conta desta grande amizade, foi presenteado com uma sanfona branca.
 O primeiro sucesso de Pinto foi “Me Botando Pra Roer”. O primeiro LP foi gravado em 1976, abrindo a série de 12 vinis, além de mais de uma dezena de CD’s e DVD’s até meados da segunda década do Século XXI. No seu currículo de compositor constam várias composições gravadas por Fagner, Elba Ramalho, Trio Nordestino, Flávio José, Jorge de Altinho, Dominguinhos e muitos outros nomes nacionais. Sua projeção em nível de Brasil teve o grande suporte com a música “Neném Mulher”, integrante da trilha sonora da novela Tiêta, da Rede Globo de Televisão, exibida entre 1989 e 1990. Outro sucesso de referência foi “Arte Culinária”, em parceria com Lindolfo Barbosa. 
Do casamento com Madalena nasceram sete filhos: Cicinho, Moisés, Alexandrina, Samuel, Priscila, Elis Regina e Madalena, todos desenvolvendo atividades iniciais no campo artístico, os quais, até a primeira década do Século XX, já haviam o presenteado com 19 netos. Na década de 90, Pinto do Acordeon enfrentaria problemas de saúde, sendo submetido a uma cirurgia cardíaca, na cidade do Recife, obtendo sucesso e voltando aos palcos.
 Em 1989, Pinto disputou uma vaga de vereador em Patos e ficou na primeira suplência, não assumindo por conta de uma diferença de dois votos com Dinoá Medeiros, o último eleito. Mais tarde, em duas legislaturas, foi vereador pelo município de João Pessoa, nas administrações de Chico Franca e Cícero Lucena, contando com o apoio decisivo da Colônia de Patos. No ano de 2003, faleceu a mãe Josefa Ferreira Lima e, cinco anos depois, o patriarca Francisco Moreno.
 Em 2008, Pinto do Acordeon participou do Festival de Montreux, na Suíça, dedicado ao Forró, ao lado de Chico César, Aleijadinho de Pombal, Flávio José e Trio Tamanduá, ocasião em que foi lançado o filme “Paraíba meu Amor”, no qual estrelou sob a direção de Bernard Robert-Charrue.
 Mesmo com sua transferência para a Capital do Estado, Francisco Ferreira de Lima manteve residência em Patos, para passar a maior parte do seu tempo, consolidando uma partícula cultural importante da história do município, mantendo a patente de Pinto que encanta porque canta.

 

 

 

Edição: Heloisa de Sousa