Paraná

ENTREVISTA

Bolsonaro faz o trabalhador decidir se morre de fome ou de vírus

"Todas as unidades vão se voltar para o atendimento emergencial"

Curitiba (PR) |

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Sobre a emenda do teto de gastos, esta tem de ser suspensa imediatamente - Marcello Casal

A coordenadora geral do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde do Estado (SindSaúde), Olga Estefania Pereira, foi a entrevistada do programa BDF Onze e Meia na segunda, 22. Olga falou sobre a situação dos trabalhadores nos hospitais do estado, da situação de pandemia e da economia brasileira. E afirma, sem meio-termos, que o governo Bolsonaro tem que acabar com o teto de gastos na saúde imediatamente.

Brasil de Fato Paraná – Como o servidor estadual da saúde está neste momento de crise do coronavírus? Tem as condições necessárias para trabalhar?

Olga Pereira – Nós, trabalhadoras e trabalhadores da saúde, do sistema único de saúde no estado, temos bastante apreensão com relação a essa nova pandemia, porque é aqui nos hospitais que estão sendo atendidos esses casos. E é importante que a população saiba que é o Sistema Único de Saúde (SUS) que está atendendo efetivamente todos os casos. O setor privado entra em caráter complementar. Estamos preocupados com as medidas adotadas que excetuam os trabalhadores de saúde. Agora, foi publicada a resolução 339, que estabelece, de forma excepcional, o regime de trabalho de servidores que atuam nas unidades da secretaria de Saúde.

Nessa resolução aumentaram, ilegalmente, a idade dos servidores. Há um decreto que diz que o grupo de risco é de 60 anos. Agora, na resolução 339, foi colocado que é acima de 65.

As pessoas entre 60 e 65 anos continuarão em seus postos de trabalho, o que é um risco maior ainda. Essas pessoas têm que ser afastadas imediatamente de acordo com o decreto 4230. O servidor da saúde não pode ter essa excepcionalidade sendo retirada. E também os que têm problemas respiratórios e lactantes.

Com relação às condições de trabalho, nosso preocupação é em relação aos insumos. Primeiro porque a Organização Mundial da Saúde disse que deveríamos fazer testes e testes. E por que tem de fazer? É que quanto mais cedo eu detecto a presença do coronavírus, eu consigo tratar essas pessoas em casa. Se espero para fazer em casos graves, gravíssimos, estou subestimando esse número. Pela definição atual, se a pessoa está com sintomas e busca o sistema de saúde para fazer o teste, ela não vai conseguir. Nem no sistema púbico nem no privado. Então pessoas que têm o vírus não são diagnosticadas porque não têm muitos testes. Se tivesse, poderíamos ter uma intervenção muito rápida na contenção do vírus.

Moradores da comunidade Tiradentes (no CIC) escreveram falando sobre suas preocupações com o Hospital do Trabalhador. Vocês têm informação de como que está ali, se tem sobrecarga?

Olga – É igual a dos outros hospitais públicos do Estado. A gente tem um pessoal qualificado, em condições de fazer esse atendimento. É o hospital que vai receber os casos confirmados.

O que a gente precisa entender é que a situação de normalidade não existe mais, todas as unidades vão se voltar para o atendimento emergencial. Só os casos graves é que serão atendidos. Consultas eletivas não estão sendo realizadas, a não ser que a pessoa esteja em estado grave.

Mas nós estamos muito preocupados com luvas máscaras, toucas, aventais, isso tudo não pode faltar. Estamos o tempo todo em contato com as pessoas para saber se elas estão tendo acesso a esses equipamentos de proteção individual, que acaba sendo de proteção coletiva porque você tem que ter uma barreira no processo de transmissão da doença.

O SUS tem sido o eixo central no combate ao coronavírus, apesar de todos os ataques que vem sofrendo, como o falta de financiamento e a emenda do teto dos gastos. Esses fatores dificultam?

É importante que a população saiba que tem dinheiro no Brasil. Esse dinheiro está lá no Banco Central, no Tesouro. Recursos para que a gente possa manter a economia girando.

Também temos reservas internacionais que podem ser utilizadas neste momento para a compra de materiais e equipamentos. Sobre a emenda do teto de gastos, esta tem de ser suspensa imediatamente. A portaria que faz um novo financiamento para a atenção primária também tem que ser suspensa.

São medidas emergenciais, o governo Bolsonaro tem de fazer exatamente isso. Porque ela tira a universalidade da atenção à saúde. Diz assim: “Só vai ser atendido quem está cadastrado”. Isso é uma quebra constitucional do direito à saúde da população, que não pode ser discriminada. O aporte de recursos do SUS já foi objeto, inclusive, do Supremo Tribunal Federal, que deu agora prazo para que o governo Bolsonaro diga quanto que já retirou dos recursos do SUS.

Temos um presidente que dá sinais confusos à população, que minimiza a pandemia. Isso causa problemas para os profissionais da saúde?

Sem dúvida. Imagine o chefe da nação tendo esse comportamento totalmente irregular. Um comportamento tosco e agressivo que coloca para a população uma situação de extremo risco. Não bastasse isso, ele ditou na calada da noite a Medida Provisória 927, que desregulamenta totalmente contrato de trabalho, joga os trabalhadores formais na rua, coloca para o patronato autoridade de pagar ou não seu salário. É um absurdo, tem que ter uma contenção imediata desse governo.

O que o governo Bolsonaro está fazendo é colocar a classe trabalhadora para decidir se morre fome ou de vírus. É um crime contra a humanidade. Se não forem tomadas medidas imediatas, nós estaremos espalhando cada vez mais essa pandemia e de uma maneira muito maior que nos outros países.

Em vez de tomar medidas protetivas, ele está empurrando as pessoas para a transmissão rápida. Elas não vão querer sair dos locais de trabalho, porque elas precisam comer. Se forem colocadas em isolamento social sem garantias de renda, vão ficar nos locais de trabalho e a transmissão vai ser muito mais rápida.

É contraditório que esses governos de extrema-direita, como o do Brasil, Itália e EUA, que propagam o fim do Estado, agora são obrigados pela emergência a adotar políticas públicas contra a crise...

Olga – Neste momento, é importante que a gente tenha a adoção de um conjunto de medidas econômicas para minimizar essa queda na atividade econômica. E nós precisamos que o Brasil olhe um pouco para os países capitalistas centrais, que estão fazendo exatamente isso. Assumindo a proteção das pessoas. Você falou em pessoas em situação de rua, elas têm baixíssima renda, que estão sofrendo com a “uberização” do trabalho e agora também dos trabalhadores formais.

Edição: Frédi Vasconcelos